No últimos dias, estou numa jornada para retomar o hábito de leitura, que sempre me acompanhou, mas que, ultimamente, tem sido difícil manter em dia.
Cansaço, falta de tempo e energia, talvez.
Mas, pouco a pouco estou conseguindo retornar ao velho hábito de ler um pouco todo dia.
O livro que estou lendo é Anna Karênina, de Leon Tolstói. Um clássico. É sobre uma passagem deste livro que vim escrever aqui.
Em certo ponto, Dária Aleksándrovna (Dolly), mãe de seis crianças, vai à aldeia, sob orientação de seu marido, passar o verão com seus filhos.
Ao chegar na casa, depara-se com uma situação calamitosa: não havia nada preparado para que eles permanecessem com conforto naquele lugar. Goteiras por toda a casa, vacas que não estavam em condições de dar leite, portanto, não havia nem leite, nem queijo ou manteiga para ela e suas seis crianças. Também não havia ovos, não havia galinhas, estavam comendo galos. Não havia camponeses para trabalhar, cozinheira, nem mesmo era possível usar a carroça. Não havia como tomar banho no rio, nem sair a passeio, pois estava por ali um touro terrível e muito bravo que provavelmente os atacaria.
Um verdadeiro pesadelo.
Com ajuda de Matrióna Filimónovna, grande parte destas questões foram resolvidas, e agora a temporada que passariam ali poderia ser mais cômoda.
Mas o que eu gostaria de apontar aqui, é sobre o íntimo de Dolly. O casamento dela estava arruinado. Seu marido era muito chegado à vida de solteiro, aos prazeres e à liberdade, não a amava. Sua vida se resumia a ser mãe e esposa, porém, seu papel de esposa perdera o significado.
Então, tudo que preenchia a sua vida agora, era cuidar de seus seis filhos.
Diz o livro: "Tranquila com seis crianças ela não podia estar. Um adoecia, outro podia ficar doente, ao terceiro faltava alguma coisa, o quarto apresentava indícios de mau caráter, etc. etc. Mui raramente ocorriam curtos períodos de sossego. Eram, porém, esses trabalhos e preocupações a única felicidade possível para ela; se não fosse isso, ela ficaria sozinha com os seus pensamentos a respeito do marido que não a amava. Mas além disso, por mais que fossem penosos para a mãe o medo às doenças, as próprias doenças e os traços de más inclinações nos filhos - os filhos mesmos pagavam a ela agora, com pequenas alegrias, as atribulações. Essas alegrias eram tão pequenas que quase não se notavam, como ouro na areia, e nos momentos sombrios via ela apenas as tristezas, a areia apenas; havia porém os bons momentos, quando via só as alegrias, só o ouro."
Esse trecho me trouxe uma identificação tão grande com as nossas nuances de sentimentos acerca da vida ao nosso redor. E não é assim mesmo?
Tem dias que estamos eufóricos, confiantes, alegres, otimistas - enxergando o copo meio cheio. Noutros dias a disposição está pra baixo de zero, falta coragem, ânimo, sobra pessimismo - o tal do copo meio vazio..
Mas o ouro na areia, o que é? O ouro na areia, na minha concepção, é a vida como ela é. A verdade dos fatos, sem impressões humanas. São os lados da moeda, as coisas boas e ruins que formam o conjunto inteiro, e não uma só parte em que estamos focados.
Nós fazemos muito isso, não é mesmo? Nós damos ênfase a um lado, a apenas uma faceta de todo um cenário. Talvez por inclinações naturais ao otimismo ou ao pessimismo, ao estado de espírito, por causa de modulações hormonais. O ser humano é uma criatura fascinante.
Por isso, pensei: quando estiver nos dias em que só conseguir enxergar areia, devo me lembrar que há um pouco de ouro ali, também.
E assim seguimos refletindo..
♡ :)
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